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Maria: da mansidão da nascente ao turbilhão da queda d’água

Atualizado: 8 de abr. de 2022

Matheus Ferreira

Vovó em frente ao caminhão da família, aproximadamente em 1982

Retorno, depois de quase um ano de pandemia, entre 14 e 17 de fevereiro e início de novembro de 2021, para Sete Lagoas. Para a mesma casa onde nasci e cresço. Após sete ou oito meses em Mariana, cheguei com o peito cheio de saudade e entusiasmo para colocar o papo em dia com o povo todo, principalmente com vovó. Tantas mágoas, tombos, brincadeiras, jogos, bebedeiras, surtos, que compartilhar com ela tudo o que vivi me tomou como ansiedade; uma urgência em ouvir sua voz e seus comentários. Coloquei as malas no chão da sala, demos um abraço demorado e aconchegante, tomei a benção e fui para a cozinha. As panelas do almoço ainda no fogão, algumas poucas louças sujas na pia e a maioria, limpas, entupiam o escorredor. A casa íntima, mas diferente. Não sei dizer o que. Claro, algumas plantas estavam em lugares diferentes da última vez que vi, durante o ano vovó conseguiu pintar a casa, transformar meu quarto num depósito de ferramentas de pedreiro, tintas, extensões de energia e outras mudanças que fui percebendo até me acostumar de novo. A cama continuou no mesmo lado esquerdo do quarto, debaixo da janela de grade preta. O pé de maracujá que vovó plantou tomou por completo uma parte do terreiro e todo o telhado de amianto da área de serviço. Às vezes, seu último galho invade a área entre a cozinha e o tanque causando irritação em vovó, que tromba de cara no ramo fino, quase verde limão.


Logo parecia ter voltado à vida de sempre, os almoços, a limpeza, o descuido em bares, encontros com os amigos e até mesmo entre os familiares. A insulina todo dia de manhã e as intermináveis conversas: horas de bate papo entre tias, primos, irmãs, irmão, pai, mães. Quando eu e vovó nos encontramos na cozinha é conversa para espumar.

Ocorreu-me, então, gravar algumas dessas conversas que frequentemente tinha com ela, fosse no café da manhã ou a partir de um encontro esporádico no meio da tarde. Algumas vezes até mais à noite, quando, antes de ir dormir, ela toma seu lanche, que na maioria das vezes é um pão torrado e chá de mate. O hábito de jantar se perdeu faz alguns anos. Essas conversas, em sua maioria, são existenciais: lembranças de infância, notas sobre a vida de filhos e netos, fofocas de acontecimentos passados e mais recentes. O papo costuma ser longo, demorado e rico em detalhes. Vovó sempre foi ótima em contar histórias.


Maria Célia dos Reis Ferreira ou “vovó”, para alguns netos como eu, é a primeira de seus irmãos. Cresceu na roça trabalhando para fazendeiros junto de seus pais, minha bisa, vovó Lia e meu bisavô José (ambos em memória). Conta que viveu dias sofridos, mas também divertidos, vez ou outra. Desde aquela época, gosta de dançar forró, hábito que não abandonou com a vinda para a cidade. Hoje, com alguns problemas de saúde crônicos colecionados e também pela pandemia, se afastou de seu hobbie e dos salões de forró. Para ela, a saúde debilitada tirou de si o ânimo para dançar. Pessoalmente, acredito que ela ainda volte para as danceterias. Não à toa, nos últimos dias, tem me convidado para acompanhá-la ao Bailão, uma casa de shows que ela frequentava no centro da cidade.


Vovó dançando forró no quintal de casa em 1995

Episódio 1 - Mandinga (confluência)


Eram 11 dias de novembro de 2020. As panelas sendo batidas, uma de pressão chiando e, às vezes, a torneira sendo aberta. O barulho era de dia, de movimento, pássaros, almoço sendo feito e cidade acordada. Vovó sentada com a cadeira distante da mesa, os braços hora cruzados, hora apoiados na pedra branca. As unhas longas se mexendo de um lado para o outro, para cima e para baixo: um gesto levemente brusco, repentino, mas tão devagar que transmutava-se entre a ignorância e a delicadeza de um vogue.

Conversamos mais de três horas. Flutuando entre os causos da infância na roça, o casamento, os seis filhos, netos, a fé, namorados, dançarias e fofocas. Thiago, primogênito da segunda filha, Giselda, além de primeiro neto, é também afilhado de batismo. A ligação se fortificou de um jeito que a escolha parece ter virado tradição, fazendo meu primo convidar vovó para consagrar seu filho Hugo, o primeiro bisneto dela.


Batizado de Thiago, 1995

Aos domingos, se arruma sem distinção de local. Vaidosa que só, vovó está sempre perfumada e acompanhada de brincos e anéis, quase sempre de vestido ou saias bem rodadas, “godê”, como ela diz. Na missa ou no forró, mal vestida ninguém a vê. Nem sem as unhas devidamente pintadas de vermelho, rosinha ou branco craquelado, uma de suas decorações de unha preferida, feita com branco e listras onduladas e sobrepostas. Mulher de fé forte e presente, mesmo quando não estava frequentando nenhuma religião ou doutrina, não discrimina nem invalida nenhuma religião, que “se tá em cima dessa terra, é porque Deus deixou”. Ainda criança, e muito cristão, eu sonhava em vê-la em um grupo de oração ou nos bancos das missas. Isso há uns 10 ou 11 anos atrás. Não compreendia muita coisa, nem sabia praticamente de nada sobre a fé dela e como, antes de eu nascer, ela já conhecia coisas que só agora estou conhecendo.


Nesse dia, vovó me contou muito sobre sua fé. Ela, que já frequentou centros espíritas, casas de umbanda, cartomantes e igrejas católicas, sempre acreditou e depositou suas boas energias naquilo que acredita trazer o bem. Não foram raras as vezes em que trabalhou com Ialorixás com quem tinha amizades para reverter situações de doenças físicas e espirituais de filhos, orações de proteção para vovô e seus filhos carreteiros, orações para eventuais consertos que apareciam para fazer no caminhão em que vovô trabalhava e todas suas rezas para que a espiritualidade estivesse sempre consigo e com aqueles para quem pedia. Mesmo assim, ficou tempos sem visitar igrejas ou terreiros, principalmente após adoecer e perder pessoas que amava. Nesses momentos, costuma dizer que o sentido da vida já não é mais visível. Quando reergueu sua fé através do catolicismo, decidiu se firmar: não se sentia mais confortável em “misturar as energias” como antes. Algumas vezes ia até o Vale do Amanhecer, centro espírita frequentado pelo filho mais velho, Cássio, mas recebeu dele a mesma instrução que decidiu seguir: firmar sua fé apenas em uma doutrina. O que, para ela, não quer dizer deixar de acreditar em todo o resto.


Ao contar sobre suas passagens por casas de santo, vovó mostra como não rompeu ou se distanciou completamente dos cultos afro-brasileiros. Sua vida sempre repleta de amizades ligadas às religiões afro, levou e trouxe pessoas para perto de seu convívio que contribuem na vividez dessas memórias.


No dia em questão, vovó narra um pouco essa proximidade, nostalgia e, ainda assim, distanciamento que sente com as religiões afro e espíritas. Ela contava sobre uma conversa com sua amiga Solange, irmã do seu falecido namorado, Walter, sobre ir ou não em sua casa de umbanda e por isso pedir que a amiga fizesse para ela os pedidos desejados:


Vovó: … Aí, ela (Solange) foi e falou: “Se… bom, se ocê tem medo, tem cisma, então não vem. Porque senão cê chega aqui, cê fica cismada, não se ocê… se tá certo ou se tá errado, não vem”. Aí, ela falou que ia pedir pra mim, mas não pediu, porque já tem três quarta-feira que eu espero ela ligar pra mim e me dá a resposta e ela não me ligou mais, sabe?


Eu: Por quê?


Vovó: Ah! Talvez é porque, como diz né: não vou pedir não, pois se ela não qué vim, porque ela é católica, então não vou pedir pra ela, né?


Eu: Uai, isso tem nada a vê, não.


Vovó: É, mas não quis pedir. Também eu falei: “Ah, azar. Tô nem aí”. Eu não quero mesmo, eu tô na igreja católica, eu vou ficar na católica. Mas cê sabe que, às vezes, tem hora que me dá vontade de mudar de religião? Não tenho motivo nenhum, mas me dá aquela vontade.


Eu: Uai vó, olha, eu hoje em dia não acredito mais que cê tem que ser assim: se ocê vai na católica, ocê não pode ir nas outras. Eu acho que…


Vovó: Pode í. Pode í, sim. Igual, cê quer conhecer uma igreja, cê pode í como visitante. Não pode batizar, essas coisa assim, né? Então, eu posso í, só não posso batizar. Mas só que eu não quero.


Eu: Ah, então se a senhora num quer, num vai, uai! Aí num tem discussão.


Vovó: Mas e a vontade, que…


Eu: Ah, então por que que a senhora num qué? Se a senhora tem vontade, a senhora qué.


Vovó: Ah. Eu, eu, eu gosto, sabe? Toda vida eu gostei. Gostei muito de baralho.


Eu: Então! Então por que que a senhora não vai?


Vovó: Aí, falei com ela: “Também, pra mim í não tem como, porque pra eu pegar lotação sozinha eu não posso, eu não consigo”. Então eu não fui.


Os dois ao mesmo tempo


Eu: Vão terça-feira.


Vovó: Mas diz ela que é muito bom.


Vovó: É toda quarta. O dela eu não sei se é candomblé ou se é umbanda. Não, é umbanda… porque ela falou da “minha cambona, num sei o que” e cambona só tem na umbanda. E tem o mesa branca que é igual o Vale, de mesa branca. É o melhor, é o mesa branca. Porque, a umbanda, ela faz o bem, mas faz… dizem que faz o mal também, né? Alguns até faz, cê pede pá fazê e faz. Paga, ele cobra. Agora, parece que o dela é umbanda e ela num cobra nada. Diz ela que é caridade, que ela tá fazendo lá, pra ajudar as pessoas que precisa. Espiritual, que às vezes tem uma pessoa que tem uma doença que é espiritual… é curado lá.


Eu: Pois é. Ó!


Vovó: O Cássio, quando ele tava desenvolvendo no Vale, ele batia, mandava a mão no peito que ele ficava com o peito doendo. Aí eles falou: “Não, cê num pode deixar eles fazê assim com cê não, cê tem que... num sei o que lá, que tinha que fazer”. Doutrinar, num sei como é que é lá, pra não bater com tanta força, pra não te machucar. E o Cássio é muito forte, lá no centro, que a gente… eu sinto sabe. Igual, eu sinto que o Cláudio (terceiro filho), ele tem uma proteção muito forte com ele. Muito mais do que Daniel (caçula). E olha que Daniel vai a missa todos domingo. Mas o Cláudio, ele tem uma proteção muito grande. E ele é muito devoto de Nossa Senhora Aparecida desde de menino, pequeno com 6 anos ele já era devoto da Nossa Senhora Aparecida.


Episódio 2: Mulher (leito)


Giselda com 6 meses de idade, 1975

A sua fé é tão forte, que não se perde nem diante do falho ser humano. Suas memórias são traçadas entre os momentos ruins e as felicidades vividas. Pulso firme, coração mole: vovó não é de pegação, não gosta de brincadeiras e, mesmo tranquila, sem estresse, sua feição é fechada, impõe distância e seriedade. Ri à toa de manotas e atos falhos de qualquer um. Às vezes até sozinha dos próprios comentários sarcásticos e maldosos que destila contra um e outro nos almoços ou eventuais visitas de familiares. Hoje mesmo, primeiro de dezembro de 2021, minha tia mais velha Jó, apelido de Joelma, veio aqui em casa depois de levar vovó na fisioterapia. No meio de setembro desse ano, ela caiu ao pisar descalça no piso molhado e quebrou o ombro direito. Se recuperando de uma forma admirável para uma senhora de 71 anos e diabética, precisou dessas sessões de fisioterapia para ter todos os movimentos do braço sem dores novamente. As duas compraram pão e pediram a Hugo que me pedisse a sombrinha que Jó me deu semana passada que acabou estragando. Minha tia separava os pães, interrompendo por poucos minutos com uma feição de desnorteio para ouvir minha explicação sobre onde havia quebrado na sombrinha. Ao fim, balbuciou um "uhum" e voltou a prestar atenção nos pães, saindo na mesma pressa com que entrou pela porta da copa. Da cozinha, comentei num tom de brincadeira “igual um furacão”. Vovó não quis perder a chance descarada de concordar e até comparar o jeito de minha tia com o meu e retrucou enquanto acompanhava Jó até a saída: igualzin.


Eu e Diego (terceiro neto) que ainda hoje moramos com ela, somos alvos fáceis de sua ironia, sua falta de papas para deixar bem posto o que pensa, o que deseja, como e porquê. As explicações para nós da família e, se necessário, para os de fora, quando compra ou recomenda algo a quem está a atendendo são diretas, bem explicadas e sem chance de muitas contestações. Acostumou-se desde nova a se virar sem precisar que lhe ensinassem. Acha absurdo minha mãe, noras e eu não sabermos picar um frango, enquanto ela sempre com atenção redobrada no que os outros faziam para que aprendesse sozinha.


Sua mãe, como ela conta, nunca precisou ensinar a ela como se faz alguma receita, era de observar e reproduzir a partir do que via e lembrava. Seu talento culinário, assim como a mão boa para plantação, é singular; só dela; só ela sabe fazer dar tão certo. Atribui a isso a calma. Está sempre chamando nossa atenção de que somos “estabanados demais” ou que “não presta atenção no que tá fazendo ou o que tamo falando e por isso esquece e faz errado”. Do êxodo rural, à ascensão momentânea, nunca deixou de ver beleza em si mesma, nos outros e na fé. Administradora nata, faz acontecer qualquer tarefa em que decida trabalhar. Cuidou de seis, antes até, quando recebeu sogra, sobrinhos e, hoje, os netos, para morar em sua casa que construiu, ao lado de vovô Ecy, falecido um ano antes do meu nascimento, em 1998.


No dia 26 de novembro de 2020, iniciamos mais uma vez nossas horas de papo e vovó contou um pouco sobre sua vida de casada, administradora da família e cuidadora dos filhos e netos:


Vovó: … de Daniel (caçula), seu pai… seu avô já tinha comprado caminhão, então a gente tinha... a gente tava com a vida melhor, né? Então eu tinha condição, né? Deles (filhos mais velhos: Joelma, Cássio, Giselda e Cláudio), já não tinha. Trabalhava de empregado, ganhava menos. Então não tinha condição de…


Eu: Nem na época da minha mãe (Daniela, quinta filha)?


Vovó: Na época da sua mãe já tinha… é, é… já tinha a, a… já tinha o caminhão, já.


Eu: Quando que vovô comprou o caminhão? Em qual filho?


Vovó: Já tinha o caminhão? Tinha, que ele já tinha até o nome dela assim, no para-barra atrás.


Eu: Hmmmmm.


Vovó: Tinha, Daniela, tinha.


Eu: Os outros não ficaram com ciúme, não?


Vovó: Não!


Eu: Ó, que gracinha!


Vovó: Ciumenta aqui, só sua mãe.


Eu: Só minha mãe, né?


Vovó: Aí… depois, aí ele teve que tirar esse para-barra, daí nasceu Matheus, ele num pôs o nome dela mais.


Eu: Eu?


Vovó: Daniel.


Eu ri.


Vovó: Aí num pôs o nome dela não, mas ficou mui´tempo com o nome dela lá.


Eu: Por que que ele tirou o nome dela porque nasceu Daniel?


Vovó: Não! Estragou o para-barra, ele teve que tirá.


Eu: Na época de qual filha, que tinha já o caminhão? A senhora lembra?


Vovó: De Daniela pra cá.


Eu: Hmm! O caminhão chegou depois que minha mãe nasceu? Ou antes?


Pensou um pouco.


Vovó: Acho que foi depois, porque… é, acho que na época que seu pai trabalhou com um homem lá da rua Policena Mascarenhas… era?


Eu: Qual rua?


Vovó: A rua do Bailão. Eu num sei se já tinha… Daniela já tinha?


Eu: Se foi antes ou depois da minha mãe, né? Muito tempo também, né?


Vovó: É…


Eu: Nossa! Minha mãe já tá com 40.


Vovó: 40?


Eu: Aham! Minha mãe é de 80.


Vovó: É… então eu acho que quando seu pai comprou o caminhão, ela já tinha nascido. Ela nasceu em 80.


Eu: Num sei não, minh’mãe pode ser assim, porque eu acho que ela chegou numa época melhor, assim… A caçulinha…


Vovó: Que eu lembro que eu fazia uns vestido muito bonito, do Daniel.


Eu: A senhora fazia vestido pro Daniel?


Vovó: Uns vestido que eu fazia pra mim quando eu tava grávida do Daniel. Muito bonito que eu fazia.


Eu: Ah tá! Ô vó, a senhora num tem mais nenhuma roupa que a senhora costurou?


Vovó: Não, nera eu que fazia não, ué!


Eu: Ah tá! Mas a senhora costurava, num costurava?


Vovó: Costurava!


Eu: A senhora já fez roupas pra senhora?


Vovó: Fiz… fazia calça e camisa até pro seu avô.


Eu: E a senhora não tem mais nenhuma?


Vovó: Não, nenhuma. Eu fazia uns vistidin tão bonitin pá Zelda, que a Zelda era tão bonitinha, toda gordinha, né? Ficava tão bonitinha, os vestidos dela… ela tinha aquele bundão! Aí ela saia com o dedo na boca e rebolano. Um dia eu fiz umas blusa de frio pra eles, aí a sua bisa, né? Mãe do seu pai: é, feliz de quem tem mãe. É que ela num teve, né? Ela foi criada com os outro. Aí viu as roupa que eu tava fazeno… Eu costurava… fiz muita coisa. Fazia croché… fiz um biquinho uma vez pruma menina… um biquinho de croché…


Eu: E ficava boas, suas roupas?


Vovó: Ficava… ficava bonitinha. Eu costurava assim… num costurava pra fora, não. Depois parei de fazê até pros menino. Aí larguei tudo.


Eu: É igual Jó, né? Começa a fazer os trem e para. E por que a senhora num vendeu?


Vovó: Ah, num pensava nisso não, Matheus. Era tudo assim… Tão diferente. E nem, eu também num tinha tempo pra fazê roupa pá fora, não uai! Eu tinha quatro menino, tudo… quas tudo numa idade só. Era pesado. Depois que passou cinco ano de Cláudio pra Daniela e sete ano de Daniela pro Daniel, mas aí eu adoeci também, né? De Daniel eu adoeci, aí eu num gosto de ficar falando isso não porque... eu fico com medo dele ficá com sentimento de culpa, né?


Episódio 3: Mãe (nascente)


Da esquerda para direita: Cássio, Giselda e Joelma, 1975

Não tenho sua paciência pra fazer as coisas. Nem é paciência não, é calma e delicadeza. Toma seu tempo pra realizar cada particular função, metodologicamente cronometrado no cozimento. Cê sente. Sente calada, sozinha e no escuro. Mostra a manha todo amanhecer repetido. Cotidianamente buscando aquilo que te negaram sistemático e com falta de dó. É a ancestralidade materna correndo no meu sangue, misturando o meu, o Seu’s, as nossas.



É mãe, iêô

se lava em lágrimas de cachoeira

encontrando depois a cicatriz da lástima


A bença eu tomo desde cedo

hora de sair e voltando

Cresço desde então.



Carta de Daniela para vovó parte 1, 1996
Carta de Daniela para vovó, parte 2, 1996

Carta escrita pela minha mãe, Daniela, em meu nome, 2005

 

Matheus Ferreira é estudante de Jornalismo da Universidade Federal de Ouro Preto.













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